quinta-feira, abril 07, 2016

Ganância

Um dia, o famoso rabi Chofetz Haim (1839-1933) recebeu em sua casa a visita de um viajante abastado. Este ficou surpreendido com a austeridade dos aposentos do rabi e perguntou-lhe:
- Rabi, onde está a sua mobília?
Ao que Chofetz Haim respondeu, também com uma pergunta:
- E a sua? Não a vejo consigo.
- A minha? - respondeu o perplexo viajante. – Mas eu sou uma visita, estou aqui apenas de passagem!
- Também eu estou de passagem – respondeu Chofetz Haim.

Serve esta história para introduzir este post sobre os Panama Papers. Este e todos os outros casos relacionados com esta área são relatados pela comunicação social, e comentados pelas redes sociais, falando-se sempre de corrupção. Mas normalmente não vejo ninguém referir o que está por detrás dela: a ganância.
O Dicionário da Língua Portuguesa Contemporânea diz que a ganância se trata de «Ambição desmedida, em geral por dinheiro ou bens materiais. (…) Ganho ou lucro ilícito.» Eu defino-a como aquela sede que leva, quem tem muito, a querer ter sempre mais e mais e mais, seja à custa do que for.
O que não aparece na definição é o grau incomensurável de destruição que a ganância arrasta atrás de si. A destruição de pessoas, famílias, nações e planeta, inclusive. Nada está a salvo da ganância. Podemos também acrescentar, sem medo de exagerar, que ela mata, e mata muita gente.
Procuro compreender, mas é difícil. No entanto, imagino que o sentimento de ganância tenha a sua origem num desejo alucinado de segurança, acompanhado de um terror, profundo e nunca aplacado, de a perder.

Na minha já longínqua juventude, li a história acima relatada. Desde então, tenho procurado viajar leve, nesta minha passagem pela terra. Não me tenho arrependido.