quinta-feira, junho 30, 2005

Os (In)Docentes

Hoje entrei num blog colectivo de professores que têm sido meus colegas e amigos ao longo dos últimos anos.
No Onde Mudar, a profissão e a política pouco entram, como já repararam.
Agora que a desconfiança e a raiva em relação aos professores subiu até níveis inauditos, senti falta de um espaço onde aquelas minhas dimensões mais públicas pudessem ficar e, ao mesmo tempo, expor-se à discussão.
Estão convidados!

Amor

No amor procuramos uma redenção por via do ser amado (do que sentimos ser uma vida interior pobre e medíocre).
É um erro.
Nunca há redenção nenhuma.
O que existe realmente são dois seres que se sentem (sentiram) insuficientemente amados. Durante toda a vida.
A ilusão de que o outro nos vai livrar dessa condenação alimenta o desejo do amor e, ao mesmo tempo, tragicamente liquida o amor.

O medo de existir (3)

"(...) os que se referem ao passado histórico, numa vontade desesperada de inscrever, de registar para dar consistência ao que tende incessantemente a desvanecer-se (e que, de direito, se inscreveu já, de toda a maneira - mas onde?)."
(José Gil, Portugal, hoje - o medo de existir, p. 15)

Comentário:
Fui ver "O Reino dos Céus" de Ridley Scott. O filme é uma mistura pouco feliz de americanada, Senhor dos Anéis, apologia da guerra (pelo deleite e extensão das cenas de guerra), e ao mesmo tempo libelo contra a guerra, enfim...

Mas há também a tentativa de "segurar" para a época actual os valores e os ideais da cavalaria e da nobreza, esta acima de tudo do espírito. E isso mais uma vez comoveu-me (como na Benzoni)! Tentativa desesperada, no entanto, atingindo por vezes as raias do ridículo (como por exemplo no discurso inverosímil de Balian quando cercado por Saladino em Jerusalém - a defesa da cidade justificada pelo amor ao povo).

Lá também a seguinte interrogação (com a qual concordo, claro): em que é que se torna um lugar, neste caso Jerusalém, quando a conquista da sua posse se funda em rios de sangue e de sofrimento? Porque a verdade é que, em vez da luta pelo poder e pela posse, somos sempre livres de escolher o encontro.

E isso leva-me a um cd que estou a ouvir neste preciso momento em que escrevo: "Mozart in Egypt". Musicalmente é muito mais que um encontro musical entre europeus e árabes. Em cada faixa entrelaçam-se variadíssimas melodias, instrumentos e vozes, atingindo por vezes harmonias verdadeiramente sublimes. Até canções de embalar aqui aparecem! Preciso de o dizer? É um cd profundamente comovente!

segunda-feira, junho 27, 2005

Um oásis chamado... Benzoni

Há uma semana que não venho aqui por dificuldades de ligação à net. Não, não me vou pôr a queixar do priv... esqueçam! Hoje só venho dizer que continuo vivo.
E falar brevemente do que tenho lido. A semana foi muito trabalhosa (sim, mesmo no dia de greve, que fiz, trabalhei com os alunos que nem um desalmado!) e pus-me a ler livros da Juliette Benzoni: "Thibaut...", depois "Renaud..." da série Os Cavaleiros. Há livros que, pelo momento em que nos caiem nas mãos, aparecem sublimes aos nossos olhos. Foi o caso!
Ali, mesmo no meio da pior trama, tudo é simples, quero dizer, as escolhas são claras e simples. E até se acredita que é simples e possível escolher o caminho mais honrado (palavra pouco ouvida esta, estranha mesmo, não é?). Nada parecido com a vida real, ou seja, um oásis...

domingo, junho 19, 2005

Não é o privado que é bom?

Tem sido dito: os funcionários públicos são uns priviligiados, têm um nível muito superior de salários e protecção social comparativamente a uma pessoa com a mesma formação no sector privado.
E eu não compreendo.
Então não é o privado que paga tão bem e dá tão boas condições que os mesmos que dizem o que atrás escrevi defendem que se deviam aumentar os salários no sector público para conseguir atrair os bons profissionais desse mesmo privado?

Tem sido dito: a qualidade dos serviços públicos é má.
E continuo sem compreender.
Tenho várias ligações como utente e como cliente com privados e garanto-vos: sou ali tão ou mais maltratado do que com entidades públicas - telefones nunca atendidos, reclamações nunca respondidas, vigarices das mais variadas e em relação às quais estou completamente indefeso ao contrário de com as entidades públicas, demoras absolutamente injustificadas, incompetências gritantes e desesperantes, e mais, mais... serei o único a quem estas coisas acontecem? Porque é que mais ninguém fala disto?

O défice ou a felicidade?

Fazer diminuir o défice é, para os nossos políticos (não se arranja letra mais minúscula que esta?):
1º, o desejo de obedecer a uma ordem (e o que os portugueses gostam de quem manda sem consideração! E então se for de lá de fora, o fascínio é total!).
2º, uma finalidade fácil, em vez de ser um meio (e não mais do que isso) para atingir objectivos autenticamente humanos... eu sei, é mais difícil.

O início

A infelicidade de uma pessoa começa com a incapacidade de estar com o outro, sendo verdadeiramente ela própria.
Aprende-se esta incapacidade primeiro com a família e depois com os amigos.
Ainda não sei como se desaprende.
Sei que não é com a solidão. Ou, pelo menos, não é só com a solidão.

Crise de ideais... ou asfixia?

"(...)Não são apenas os ideais, os sonhos, que estão a morrer - porque esses também nascem, crescem e morrem - mas é a própria arte de sonhar. É o acreditar como acto criador de valores que está em crise. E isso deve-se(...)" (Orfeu dos Santos em a Fonte do Horácio)

É com os outros que me confirmo como ser humano. Se, no espaço habitado por mim e por esses outros, o que conta é a acção e dentro desta o que interessa já nem é a sua eficácia mas sim o seu impacto, então podemos ter manifestações que juntam milhares de pessoas a gritar palavras de ódio e de estupidez, sejam elas quais forem.

(E os políticos, ao tratarem na prática com o mesmo desprezo acções que são diferentes, só estão a contribuir para que isso se acentue.)

Alguém dizia (Aldous Huxley?) que por detrás de acções estão ideias, e por detrás das ideias estão as palavras. Por isso é tão essencial para uma acção consequente a discussão de ideias. Não se trata de discussão no sentido de um duelo verbal que tem a finalidade de brilhar ou de derrotar o adversário. Trata-se sim de discutir para ajudar a esclarecer e a construir ideias consensualmente melhores. A acção deve vir depois.

Terão os nossos cidadãos, jovens, adultos ou idosos, já não digo um espaço (a escola?, a família?, perante o império do audiovisual?), mas um clima favorável à construção reflectida de ideias e de acções?

Para mim "É por isso que hoje..., já não há camaradas." (Orfeu dos Santos, idem)

sexta-feira, junho 17, 2005

Trabalho voluntário

Chego ao fim de uma semana cheia de acontecimentos bons.


Hoje foi a festa de fim de ano (lectivo) do sítio onde faço trabalho voluntário, no âmbito do Projecto de Luta contra a Pobreza, na Associação Luís Pereira da Mota, na Quinta das Sapateiras em Loures. Não é nada de especialmente custoso, apenas uma tarde por semana a dar apoio aos miúdos nos estudos, no meu caso mais na Matemática.


Nunca falei de trabalho voluntário? Nem sei como, dado que desde os 14 anos (há 33 anos!...) que participo em acções de trabalho voluntário.


Dos 14 aos 31 anos gastei muitas das minhas férias a trabalhar gratuitamente em sítios recônditos de Portugal, através de uma organização chamada Companheiros Construtores sediada em Coimbra.


Trabalho físico duro (normalmente construção civil), comunidades de jovens vindos de toda a Europa, pessoas interessantíssimas, pois só gente diferente está disposta a trabalhar nas férias, sem receber um tostão e em lugares perdidos e afastados de quase toda a civilização. Experiências e pessoas únicas que ainda hoje recordo com uma profunda e dolorosa saudade.


Foi ali que tive a minha primeira paixão, uma italiana doce e boa, a Celi, que me deixou amá-la, à distância claro (eu tinha 14, ela 28 anos!), mas sem nunca me magoar nem deixando que eu me magoasse... uma sabedoria que nunca encontrei em ninguém, infelizmente nem em mim para a poder passar a outros.


Os campos de trabalho voluntário são a única saudade do passado verdadeiramente enraizada em mim. Nenhuma outra coisa me faz desejar tanto voltar atraz no tempo como estes campos (ah, a sua força e pureza!)...


Agora recordo o sorriso caloroso dos miúdos na festa, as suas brincadeiras a meterem-se comigo e embaraçando-me à frente de outros colegas voluntários, enfim laços que se criam e que eu, infelizmente mais uma vez, tenho muito menos sabedoria do que eles para os conseguir manter.

sexta-feira, junho 10, 2005

"Os ovários no sítio"

A propósito de se encontrar uma expressão alternativa a "os tomates no sítio" num post do Bruno com o mesmo título do meu (e que já era resposta a um post de Fernanda Câncio ), escrevi o seguinte comentário (que também leva em conta outros comentários):

Bruno, lembras-te do Ricardo Coração de Leão? Porque não o coração? Eu sei, já está conotado com outra coisa. Mas paremos um pouco.
Todas as anteriores expressões têm como quase (este quase é para antecipar as excepções) exclusiva referência à qualidade (des)humana da dureza e à quase (idem) ausência de sentimentos. Ora, o "coração" envolve muito mais a ideia da pessoa no seu todo do que os ovários, as mamas ou os tomates. Não tem uma conotação sexual tão explícita, podendo aplicar-se a homens e mulheres sem desprimor para ninguém. E tem a vantagem de não haver ninguém sem coração, logo ninguém fica diminuído.
"Aquele ou aquela tem o coração no sítio": bela expressão! Se não aparecerem outras propostas para reflexão, eu voto no coração!

O medo de existir (2)

(...) Mas não se constrói um "branco" (psíquico ou histórico), não se elimina o real e as forças que o produzem, sem que reapareçam aqui e ali, os mesmos ou outros estigmas que testemunham o que se quis apagar e que insiste em permanecer.
Quando o luto não vem inscrever no real a perda de um laço afectivo (de uma força), o morto e a morte virão assombrar os vivos sem descanso" (Potugal, hoje - o medo de existir, p. 16)

Comentário

Primeiro. Perante uma situação que me magoa, a tentação de optar por fingir ignorá-la, por fingir que ela não é importante, é grande. Mas se não procuro mudar a situação ela pode permanecer sem grandes alterações e por muito tempo. É então por muito tempo que ela não nos larga por mais que eu queira virar-lhe as costas.

Segundo. Uma maneira de esquecer, e de não ter portanto de actuar, é eu pensar que a situação não é tão má assim, que há-de acabar por passar (influência crescente das religiões orientais mais centradas no eu que no exterior?) ou pensar que a perda/morte ocorreu sem eu querer saber realmente se ela ocorreu mesmo. Mas o meu organismo "sabe", não se deixa enganar. A tentativa de esquecimento falha e há uma enorme tristeza ou cansaço que não me larga, como se as minhas sucessivas cobardias pesassem toneladas.

Terceiro. Se a perda ocorre realmente, então há que fazer um luto autêntico, senão essa perda nunca fica resolvida dentro de mim. É por isso que eu não posso nunca ser amigo de alguém que amo mas que não me ama (apesar da amizade estar incluída nesse amor, não consigo é separá-las): fazer-me de amigo, com autenticidade e não com segundas intenções, seria tentar apagar até a memória desse amor ferido... que nunca, mas mesmo nunca se apaga, por mais amores que eu tenha a sorte de viver. E sou mais humano vivendo com essa dor do que tentando viver amputado dessa mesma dor. E sou menos assombrado por ela, ou seja, ela surge-me sim mas de modo claro e sem se manifestar de forma distorcida e penalizante para mim, mas especialmente para os outros.

segunda-feira, junho 06, 2005

Ver o jogo

Não gosto muito de jogos porque neles há sempre pelo menos um derrotado. E a tristeza do derrotado para mim sobrepõe-se à alegria do vencedor.
Feita esta nota prévia, os meus desportos favoritos como espectáculo são:
- o rugby porque uma boa equipa tem de ter todos os tipos de atletas: altos e baixos, fortes e franzinos; além disso, é um jogo em que nunca se pode perder a cabeça porque tem de se fazer tudo ao contrário do que apetece: não se pode atirar a bola para a frente, chutar só depois dela bater no chão e ainda por cima não é redonda!
- o volleyball porque é um jogo visualmente elegante, principalmente jogado por mulheres, e há pouco contacto físico, ou seja poucas oportunidades de lixar o adversário com golpes baixos e brutais.

domingo, junho 05, 2005

O medo de existir (1)

Já aqui uma vez disse que, no amor, sou como o Cristovão Colombo... só que sem a América!
Terá sido a coisa mais verdadeira que eu disse de mim mesmo? É que agora acho que não é só no amor, mas enfim...

Ocorre-me isto porque ando há muito tempo para falar deste livro:

Portugal, hoje - O medo de existir, de José Gil, ed Relógio d'Água.

Não o fiz ainda porque percebi que falar dele é falar de mim e das minhas facetas negativas - das minhas inexistentes Índias ou Américas.

Bom, mas José Gil foi criticado por dar um retrato exclusivamente negativo dos portugueses, ou seja, por de certa maneira não apresentar propostas positivas e construtivas.
Discordo desta crítica.
Primeiro porque, ao denunciar nos portugueses a tendência para seguirem os caminhos indicados por outros, JG foge coerentemente a prescrever caminhos.
Segundo porque as propostas, as pistas para sair da situação estão lá no livro, cada um que as descubra, as construa e as aplique. Foi o que fiz e irei de vez em quando dar conta desse meu trabalho. Note-se: a perspectiva em que me coloco é pessoal, não é política nem social.

p.14, "A resignação leva à impotência, a passividade à inércia e ao imobilismo (...)"
Comentário:
Só fico impotente quando me resigno e não me mexo: é uma impotência estéril que não muda nada. Pelo contrário, a impotência que é criativa vem de eu tentar, mesmo que não consiga. Digo criativa porque por este processo cresço e (re)crio-me.

Mulheres Afegãs

Graças ao Bruno do blog avatares de um desejo comprei um livro extraordinário:
A Voz Secreta das Mulheres Afegãs - o suicídio e o canto, de Sayd Bahodine Majrouh, ed. cavalo de ferro.
Tenho folheado ao acaso com medo do encantamento se desvanescer, por isso não posso dizer nada de consistente sobre ele... mas também, se calhar, depois de lê-lo, tudo o que eu disser ficará aquém do que este livro é.
Posso citar alguns dos poemas? A resposta já sei que é não, primeiro porque é impossível escolher, segundo porque vou retirar do contexto... mas não consigo resistir à tentação.

Se não sabias amar,
Porque despertaste o meu coração adormecido?


Vem e sê uma flor sobre o meu peito
Para que eu possa, cada manhã, refrescar-te com o meu riso

sexta-feira, junho 03, 2005

A partilha da dor

Ah, eu também era muito assim, quando estava mal ninguém ficava a saber, desaparecia, mas agora isso não me parece que seja uma coisa boa. Por duas razões.
Primeiro porque constitui um (mau) exemplo que os outros seguem e que acaba por os deixar mais e mais sozinhos (às vezes, ao finalmente me ser dada a conhecer a sua dor, fico verdadeiramente assustado com a intensidade da sua solidão).
Segundo, porque, pelo menos numa perspectiva egoísta, acho que é muito mais com os outros que eu consigo fazer da dor um instrumento de transformação e crescimento interior.
De qualquer modo isto talvez não tenha muito a ver com a exposição pública num blog, estando eu de facto sozinho em frente a um computador. Aqui se calhar não se aplica o que para trás ficou dito.

A dor no(s) blog(s)

A dor, não a dor física, mas a dor associada ao facto de existir (e de eu existir de forma desde sempre desastrada), é uma parte muito significativa da minha vida, tanto no tempo como na profundidade. No entanto, eu raramente a ponho aqui. E noutros blogs fazem o mesmo que eu. Porquê?
Há algo no sofrimento que seja um tanto obsceno aos olhos dos outros e daí que se evite mostrá-lo? E o que é que significa este adjectivo "obsceno" usado neste contexto?
Será que, ao me expor publicamente, sinto a obrigação estrita (como se se tratasse de um contrato assinado entre mim e os que me lêem) de divertir os outros?
Ou acredito que, por falar na minha dor, vou constituir um peso desagradável para esses outros e que, por baixo disto tudo, está o medo de ser abandonado, deixado de lado, sozinho?
Ou que gozem com a dor, a amesquinhem e a banalizem? Ou seja, tenho é medo que desprezem a minha fraqueza, a minha falta de inteligência?
Não sei, mas suspeito disto tudo.


Como é que eu reajo quando as pessoas me falam da(s) sua(s) dor(es)? Sinto-me muito constrangido? Às vezes sim, principalmente quando não sei como ajudar. Normalmente não, porque como tenho bastante experiência nesse domínio e nunca deixei de lutar contra essa fatalidade (espero que não o seja!), posso passar muita coisa que sei que resulta, ou então simplesmente compreendo e mostro que compreendo (porque realmente compreendo mesmo).
Em muitas dessas situações vejo que são a altura necessária de eu transmitir à pessoa dominada pela dor o quanto gosto dela, o quanto ela é importante para mim (tendo uma namorada ciumenta isto é muitas vezes um grande, grande problema!).


Bom, depois desta conversa toda, começo ou não a falar das minhas dores? Para já, não... Não? Mas neste post já falei, não foi? :)

quarta-feira, junho 01, 2005

Dia Mundial da Criança

A verdadeira beleza tem, para cada um de nós, um rosto e um nome; e esses são os do(s) nosso(s) filho(s).
Carinhos e muitas felicidades para todos eles!


Só para lembrar:
Maltratar crianças de qualquer forma, até por simples negligência, é crime público. Quer isto dizer que nem é precisa uma queixa para iniciar um processo-crime. Quer isto dizer também que devemos todos denunciar às autoridades todos os casos de maus tratos a crianças de que tenhamos conhecimento.
Claro que as autoridades nem sempre actuam como devem. Ou os maus tratos agudizam-se quando a(s) pessoa(s) que maltratam sabem que foram expostas. Também não tenho uma resposta para isto. Só sei que ninguém deve ser maltratado, incluindo as crianças, principalmente as crianças (porque não conseguem defender-se).