quinta-feira, outubro 13, 2011

A (falta de) saúde mental dos portugueses

No Público de 10 de Outubro de 2011

(...) um em cada cinco portugueses já sofreu de uma doença psiquiátrica e quase metade (43%) já teve uma perturbação psicológica durante a vida. "Portugal parece ser o país da Europa com maior prevalência de perturbações mentais na população, (...)

Esta notícia assusta-me, mas não posso dizer que me surpreenda. Porquê?

Primeiro, porque os portugueses não são simpáticos uns para os outros. Não o são nas estradas, não o são nos empregos, não o são em quase lado nenhum. Os portugueses não se tratam bem uns aos outros: a dureza, a arrogância, o desprezo são vistos como qualidades, não como defeitos. E as pessoas que ostentam estas caraterísticas são as que mais sobem na vida, são as que mais conseguem obter coisas dos outros. E, naturalmente, não vêem razão para pararem de ser o que são.

Vê-se bem esta falta de simpatia nas demonstrações de gratidão, por exemplo. Quer dizer, não se vê, pois quase nunca ninguém agradece nada a ninguém. Os portugueses acham que quem lhes faz qualquer coisa em seu benefício, não fez mais do que a sua obrigação. Portanto, não merece agradecimento; nem sequer reconhecimento.

Por outro lado, os portugueses, cada vez mais tão naturalmente que já nem se dão conta, promovem entre si uma cultura de sofrimento, de queixumes, de mal-estar, de negativismo e de desânimo. Com óbvio comprazimento mútuo.

Neste ambiente social, as pessoas cada vez mais recebem dos outros a imagem de uma existência menor, ou mesmo de uma não-existência. As pessoas sentem-se sós e têm razão para isso. E, claro, as perturbações momentâneas que noutras circunstâncias não seriam mais do que isso mesmo, neste ambiente de ausência de suporte mútuo tornam-se permanentes e graves.

Eu espero que esta crise seja a oportunidade para as pessoas perceberem que é absolutamente necessário, no seu dia a dia, apoiarem-se umas às outras. E que os psicólogos e os futuros psicólogos sejam promotores activos dessa maneira nova de estar na vida. Nova e mais feliz.

sábado, outubro 01, 2011

Praxes e psicólogos

Já escrevi aqui contra estas práticas aberrantes. Então, espantava-me com as atitudes dos professores face a elas. Hoje, viro-me para os psicólogos: os que o vão ser no futuro e os que ensinam a sê-lo. Na Universidade do Algarve.


Do Meta Código de Ética aprovado pela Assembleia Geral de Atenas em Julho de 1995:

Os psicólogos também se empenham  em ajudar o público a desenvolver opiniões fundamentadas e escolhas no que respeita ao comportamento humano e empenham-se ainda em ajudar o público em geral a melhorar a condição humana individual e em sociedade.


Os psicólogos defendem o respeito apropriado e promovem o desenvolvimento dos direitos fundamentais, dignidade e valor de todas as pessoas. Eles respeitam o direito de (...) auto-determinação e autonomia, consistente com as outras obrigações profissionais do psicólogo e com a lei.


(...) Os psicólogos evitam prejudicar e são responsáveis pelos seus próprios actos e certificam-se, tanto quanto podem, que os seus serviços não são inadequadamente utilizados.


3.1. Respeito pelos Direitos e Dignidade do Ser Humano: (...) c) Evitamento de práticas que sejam o resultado de vieses incorrectos e que possam conduzir a discriminação injusta.


Os alunos do 1º ano (muitos deles longe da suas casas , das suas famílias, vulneráveis e assustados pela nova vida que estão a iniciar) são recebidos e tratados como "bestas" (é assim que são chamados), entram em desespero e terror perante as práticas brutais a que são sujeitos, e chegam a dizer que querem abandonar o ensino universitário por não suportarem mais a maneira como são tratados. E isto às mãos de colegas mais velhos (também do curso de Psicologia)!...

Estes indivíduos, que retiram um óbvio prazer das práticas sádicas que promovem (ainda por cima, certamente, com um conhecimento refinado pelo curso que andam a tirar), estes indivíduos: que tipo de psicólogos se irão tornar?

Porque grande parte de tudo isto é feito às claras, à frente dos olhos de toda a gente, acrescento que sinto uma enorme tristeza pela impotência e incapacidade reveladas pela minha Universidade (que aprendi a amar e a respeitar desde que para lá entrei) em conseguir proteger desta violência os seus alunos mais jovens e mais desamparados


Adenda:
A mim espanta-me que os jovens não percebam o sofrimento que infligem, nem o quanto se rebaixam ao rebaixarem os outros.
Mas, não compreendendo isto, há que arranjar maneiras de moderar a sua acção. E isso parece-me que só será conseguido através da acção de pares (já que os adultos, eu incluído, note-se, se mostram impotentes).
Já por várias vezes tenho sugerido que se deveriam organizar grupos de 2 ou 3 estudantes dos últimos anos que andariam pelo campus com a função de apoiar os alunos do 1º ano que precisassem de ajuda.
Esses grupos, sendo naturalmente constituídos por jovens em desacordo com a forma como as praxes se desenvolvem, não teriam por função entrar em confronto com os praxadores, mas apenas mostrar aos mais novos que eles têm liberdade de escolha, que não são obrigados a suportar tudo o que lhes é feito.
Teriam, assim, um papel moderador e talvez conseguissem prevenir muitos abusos, só pelo efeito da sua presença.