Vi as fotos que uma amiga publicou de uma quinta no Douro. Fiquei com vontade de dar um mergulho naquela piscina. Procurei pelo nome, "não aceitamos crianças". Foi na mesma semana em que o B. me falou de um lugar incrível que havia no Algarve, "não aceitamos crianças com menos de cinco anos", avisava esta unidade hoteleira. Pensei fazer uma lista de todos estes nomes onde, se não aceitam o meu filho, também não me aceitam a mim. Depois, percebi que isto de ter espaços childfree - livres de crianças - está a alastrar. Há quem faça convites de casamento "só para adultos". Por mais que perceba que as crianças podem ser barulhentas, foram os adultos quem sempre me incomodaram. Fazerem das crianças um filtro na pesquisa de alojamento é muito discutível. Daqui a pouco, temos filtros para encontrar hotéis "gordosfree", "velhosfree", "mulheresfree"...
(Joana Almeida Silva, JN de 27-05-2023)
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Um mundo, qualquer mundo, sem crianças é um mundo onde a morte começa a instalar os seus arraiais. As crianças simbolizam o início, a renovação, a inocência e, acima de tudo, a alegria. Bem tristes devem ser as pessoas que não conseguem ver isto para além das birras e de outros comportamentos. Que são sempre, mas sempre, sempre, muito menos graves do que a selvajaria (ver parágrafo a seguir) de que os adultos são capazes (e que praticam, sim, claro, em todos os lados incluindo nesses lugares que proíbem a presença de crianças).
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Jornal de Notícias de 04-06-2023:
Bárbaro homicídio de criança de três anos à pancada e com torturas (...)
A semana de 14 a 20 de junho em que Jéssica esteve em cativeiro na casa dos homicidas, no Beco do Pinhana, foi de terror para a menina. Agredida de forma brutal, foi-lhe atirado um líquido abrasivo para a cara que a desfigurou e foi usada para tráfico de droga. A autópsia identificou 125 ferimentos no seu corpo (ver texto ao lado). Colocaram-lhe até cocaína à força dentro do corpo.
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Em seis páginas do relatório da autópsia que consta na acusação aos alegados homicidas de Jéssica, o Ministério Público (MP) aponta 125 golpes no corpo da menina, incluindo o derrame de um produto abrasivo na face que lhe removeu por completo a pele do nariz e buço. Só na cabeça, são 25 os golpes, outros 60 nos braços e pernas, 30 no peito, seis no abdómen e cinco na zona genital.
Cristina e os filhos desta, Eduardo (o único em liberdade) e Esmeralda, de acordo com o MP, na semana de 14 a 20 de junho, utilizaram a menina como "mula" de droga e violaram-na, introduzindo-lhe cocaína no ânus, numa viagem entre Leiria e Setúbal.
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Em maio, a menina já tinha sido entregue aos raptores durante dois dias por causa de uma primeira dívida de Inês por um serviço de bruxaria no valor de 100 euros. Ela conseguiu pagar, mas quando Jéssica lhe foi devolvida, estava tão maltratada e ferida, que "apenas se alimentou de líquidos durante uma semana", pode ler-se na acusação. Isso não impediu que, a 14 de junho, Inês a entregasse de novo. Desta vez, não sobreviveu.
Estas unidades hoteleiras receberiam estes adultos sem problemas, mas recusariam admitir a criança...
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Revolta sempre que se fazem generalizações abusivas a partir de uma minoria de casos. Porque a esmagadora maioria das crianças, na esmagadora maioria do tempo, porta-se bem – e eu sei do que falo, pois fui professor durante a maior parte da minha vida profissional (e não foi em escolas de elite!). Revolta, principalmente, que haja hotéis (sim, no Algarve também) que anunciam “Não são permitidas crianças”, como se se tratasse de animais e não de seres humanos.
E acima de tudo, dói que este tipo de discriminação não suscite uma revolta generalizada. Se fosse qualquer outro grupo da população, vulnerável e sem voz, o escândalo seria enorme. Com as crianças, acha-se natural.