quinta-feira, maio 22, 2008

Dogville, de Lars von Trier


Pai de Grace: A única coisa que tu culpas são as circunstâncias. Violadores e assassinos podem ser vítimas, em tua opinião. Mas na minha são cães, e se lambem o próprio vómito só os podemos impedir a chicote.

Grace: Os cães seguem a sua natureza: não lhes devíamos perdoar por isso?

P: Os cães podem aprender muitas coisas úteis, mas não, se lhes perdoarmos sempre que eles seguirem a sua própria natureza.

G: Então, sou arrogante. Sou arrogante por perdoar às pessoas?

P: Meu Deus, não consegues ver o quão condescendente és ao dizeres isso? Tu tens esta noção pré-concebida que ninguém – ouve! – ninguém pode chegar aos mesmos padrões éticos que tu e, por isso, perdoas tudo. Não consigo imaginar nada mais arrogante que isso. Tu, minha filha, minha querida filha, tu perdoas aos outros com desculpas que nunca aceitarias para ti própria.

G: Porque é que não posso ser compassiva?

P: Não, podes ser, deves ser, quando for a altura de ser compassiva. Mas tens a obrigação de manter os teus próprios padrões, tu deves-lhes isso, tu deves-lhes isso. O castigo que tu mereces para as tuas transgressões, eles merecem para as suas transgressões.

G: Eles são seres humanos...

P: Não precisam todos os seres humanos de serem responsáveis pelas suas acções? Claro que sim, que precisam, só que tu nem lhes chegas a dar essa oportunidade. E isso é extremamente arrogante. Eu amo-te, eu amo-te, eu amo-te até à morte, mas tu és a pessoa mais arrogante que já conheci até hoje. E é a mim que achas arrogante! Não tenho mais nada a dizer.

(...)

G: As pessoas que aqui vivem fazem o melhor que conseguem dadas as circunstâncias em que vivem, circunstâncias muito duras.

P: Se tu o dizes... Mas será o melhor delas suficientemente bom? E gostam elas de ti?

(...)

Narrador: E de repente soube demasiadamente bem a resposta à sua questão, à sua dúvida.
Se ela tivesse agido como eles, ela não conseguiria encontrar uma única desculpa para as suas acções e nunca conseguiria castigar-se a si própria o suficiente.
Era como se a sua pena e a sua dor tivessem encontrado o seu lugar correcto.
Não, o que eles tinham feito não era suficientemente bom.
E, se alguém tinha o poder de corrigir as coisas, então era seu dever fazê-lo, para o bem de outras vilas, para o bem da humanidade.
E não por último, para o bem do ser humano que era Grace, ela própria...

(transcrição feita a partir do filme)

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