sexta-feira, maio 28, 2010

Ainda e, agora, sempre Os Maias

Romance fabuloso! De uma inteligência extraordinária!
Tanta coisa de que eu gostaria de falar, de discutir, de partilhar... acho, pelo menos, que consegui "infectar" os meus alunos com o meu entusiasmo.

É tão fácil começarmos por nos identificar com Carlos da Maia, embora sempre, admitamo-lo, com um certo sorriso. Mas ele é o herói do livro, no fim de contas.
Só que Eça é um perverso e põe-lhe todos os defeitos dos portugueses, açucarados pelo charme, pela beleza e pela fortuna, facilitando essa nossa identificação com ele... até que aqueles começam a ser tão evidentes que começamos a sentirmo-nos desconfortáveis por esta ligação emocional que estabelecemos com Carlos.
No fundo, Carlos é um inútil, um fraco, um indolente. O retrato feito por Afonso da Maia é curto e exacto: "O velho escutava com melancolia estas palavras do neto, em que sentia como uma decomposição da vontade, e que lhe pareciam ser apenas a glorificação da sua inércia. (...)" (Cap. XII).
Mas até o próprio Afonso da Maia, tirando a sua bondade, nada faz nem fez de significativo. Ele é bem um Maia que, por via de princípios de que não abdica facilmente (agora na velhice, porque na sua juventude não teve problemas com isso) e que lhe dão uma certa forma de integridade, parece ter mais substância do que Carlos, mas de facto não tem.

De todos os defeitos expostos por Eça aos nossos olhos, do Carlos (e de quase todas as outras personagens), o que mais me impressionou foi o medo. Um medo que se traduzia por uma insidiosa cobardia nas situações que exigiam na verdade um esforço para poder manter o respeito por si próprio. Carlos é lamentavelmente falho desse tipo de esforço. A cobardia é nele uma doença, tanto mais terrível quanto nunca o aparenta ser; e ele chega ao fim sem nunca perceber o quão baixo se permitiu deixar ir.

Há, no entanto, duas personagens que escapam a este retrato impiedoso. Um em tom menor: Vilaça que, não fora a sua tacanhez, poderia vir tornar-se uma personagem digna de admiração.

Mas em tom maior, grandioso mesmo, sem dúvida alguma, é a Maria Eduarda: faz o que tem de fazer, com nobreza, discretamente e sem dramas nenhuns. E acaba com um gesto verdadeirante grandioso: recusa receber o que quer que seja da herança à qual, aliás, tem todo o direito legal e moral, pois ela é uma filha legítima e de direito de Pedro da Maia. É uma personagem verdadeiramente admirável, sem nunca deixar de ser humana, no meio de um friso mais ou menos repulsivo de entes cheios de empáfia, mas realmente sem qualidade alguma.

Sem comentários: