domingo, fevereiro 27, 2011

As derrotas não existem; o que existem são novas batalhas

Quando travamos uma batalha e perdemos, faz-se uma escolha: juntarmo-nos aos vencedores ou afastarmo-nos.
Para os que se afastam há um momento épico, o do afastamento. E, depois, pouco mais.
É-se ignorado, é-se esquecido, é-se afastado e cai-se na pobreza dos dias dedicados por inteiro à luta pela simples sobrevivência (dado que não se ficou com os vencedores).
Mergulha-se na obscuridade.
É muito difícil superar este estado, pois ficou-se sozinho, ninguém vem ajudar.
A única forma de não passarmos a ser parte dessa "austera, apagada e vil tristeza" é envolvermo-nos noutra batalha. Por muitos sacrifícios que isso implique. Para nos mantermos vivos.

quarta-feira, fevereiro 23, 2011

Sombras do salazarismo

Quando surge uma nova lei que é sentida como violentadora e injusta, nunca se pensa no que se pode fazer para a combater ou modificar.
Quando estive nos E.U.A. vi como os americanos reagiam e rapidamente se mobilizavam para lutar, eficazmente, contra uma lei acabada de ser aprovada.
Mas os portugueses, não, o que fazem primeiro é tentar descobrir como podem ou usar a lei a seu favor, "dando-lhe a volta", ou infringi-la sem parecer que o estão a fazer.
São sombras longas do salazarismo que se estendem ainda aos dias de hoje. Apesar de vivermos em democracia, hoje ainda é impensável a revolta clara e franca (tal como na ditadura).
Se somarmos a isso uma certa ideia prevalecente de que qualquer resistência é inútil (aí, a luta fracassada dos professores estabeleceu um padrão difícil de desaparecer do inconsciente colectivo), temos os ingredientes q.b. para uma sociedade doente, paralisada, irresponsável, sem regras e em que só ganham os chico-espertos. E os mais ricos.

domingo, fevereiro 20, 2011

Consideração... mais um exemplo

Tenho dito que sou mais bem tratado no privado do que no público.
Esta semana, no centro de explicações. Uma explicanda nova:
"Setôr, podia ..."
Interrupção imediata por uma outra miúda:
"Não é setôr, é professor!"
"Então, não é a mesma coisa!?"
"Aqui, não!"

sexta-feira, fevereiro 18, 2011

Judo verbal, versão agressiva

Técnica que consiste em aproveitar-se do ataque do adversário para o derrotar.
2 exemplos:

Bernard Shaw, depois de ter visto uma sua peça representada, enviou um telegrama à actriz principal em que dizia: "Admirável!"
A actriz respondeu-lhe, igualmente através de um telegrama: "Não merecedora de tal elogio."
Bernard Shaw, mal disposto, retorquiu: "Referia-me à peça!"
A actriz respondeu-lhe: "Eu também."

A: "Estás bonita hoje!"
B: "De ti não posso dizer o mesmo."
A: "Faz como eu: mente!"

quarta-feira, fevereiro 16, 2011

Valores e traços de carácter que passaram de moda...

... como a honra e a timidez.
Junto-as porque me parece estarem próximas uma da outra.
E são ambas muito mal vistas:
  • A honra é criticada e classificada como rigidez, ausência de flexibilidade.
  • A timidez é encarada como uma doença execranda (daqui a pressão para mostrarmos sempre que não somos nada tímidos).
Tudo isto é-nos passado assim para nos sentirmos envergonhados.

segunda-feira, fevereiro 14, 2011

Não seguir. E não ser seguido.

Tous les suivants du monde devraient se donner la main
Voilà ce que la nuit je crie dans mon délire
Au suivant, au suivant


Et quand je ne délire pas j'en arrive à me dire
Qu'il est plus humiliant d'être suivi que suivant
Au suivant, au suivant



Parece estranho que um professor subscreva isto... É verdade, reconheço-o. Muitas vezes, junto dos meus explicandos, tenho dificuldade em mandar, há qualquer coisa de redutor, de violência, procurar a submissão dos outros e sempre me esforcei mais por convencer do que por vencer.

(Recordo Gandhi: Se venceres o teu adversário, ganhas um inimigo; se o convenceres, ganhas um aliado)

Sempre me senti desconfortável nesse papel, pelo que nunca aspirei a cargos onde tivesse que mandar noutros.

(Evoco também Guilherme Centazzi, nascido em Faro em 1808, não como regra geral, mas como símbolo de uma certa limpidez de carácter: Não estou em grandes alturas, porque sou inimigo de baixezas. Via Pedro Almeida Vieira)

Ah, mas também grito, com Jacques Brel na canção acima, que
un jour (...) je ne serai jamais plus
Le suivant, le suivant!

domingo, fevereiro 13, 2011

No pasarán!*

17% é quanto tem de passar a pagar mais à Segurança Social em 2011, relativamente a 2010, quem ganha menos que o ordenado mínimo.
17% (dezassete por cento).

Mas...
(...), venha o que vier, nunca será
Maior do que a minha alma.

                                                         (Mensagem, Fernando Pessoa)

* Divisa que expressa a determinação de defender uma posição contra o inimigo

domingo, fevereiro 06, 2011

Em Busca da Identidade - o desnorte, de José Gil

Uma radiografia certeira e incómoda de Portugal:
  1. Os velhos traços da política salazarista que estão aí para ficar: usar o medo (da autoridade, da avaliação, da crise, etc.) para governar.
  2. As velhas estratégias de relacionamento dos portugueses com a sociedade onde vivem: inércia, falta de confiança, auto-complacência, queixume, inveja, desenrasque, chico-espertismo, irresponsabilidade, ausência de respeito pelo outro, corrupção.
  3. O quão sufocante tem sido o exercício de poder dos governos Sócrates (ao mesmo tempo que promovem todas as características referidas anteriormente).
  4. A usura das exigências que são feitas ao trabalho imaterial sobre a vida das pessoas, enquanto a avaliação se exerce apenas sobre os seus produtos materiais. 
  5. A avaliação como estratégia de poder que visa produzir submissão. O caso dos professores.
Este é um livro para ser estudado e discutido pelas pessoas que se preocupam deveras com o caminho que Portugal está a seguir.
Para o salvar da destruição? Já não acredito que seja possível. O poder está cada vez mais absoluto e desavergonhado, enquanto as pessoas estão cada vez mais mergulhadas no medo. Que é alimentado, pois o medo é extraordinariamente útil para se poder governar/abusar sem resistência.
Não, apenas para cada um poder salvaguardar a sua própria dignidade (e a dos seus mais chegados), a fim de evitar mergulhar neste pântano mental e social. Mais nada.

terça-feira, fevereiro 01, 2011

Festa de aniversário

Os meus amigos ficam desagradavelmene surpreendidos quando se dão conta de que não foram convidados para a minha festa de aniversário.
Têm razão. Devo-lhes uma explicação. É simples: não faço uma festa de aniversário.
Uma festa dessas é sempre uma celebração pelo nascimento da pessoa. As pessoas gostam de ser objecto dessa celebração. Eu sinto-me muito desconfortável.
Face a tanta miséria, dor e morte à minha volta e no mundo, eu vou celebrar com uma festa o meu nascimento? Eu não consigo.
Limito-me assim a algo de mais discreto e privado.
Que me desculpem os meus amigos.