terça-feira, agosto 26, 2008

O que torna desinteressante tanta opinião

Para Marco Fortes, de Rui Tavares. Brilhante. No 5dias.

E percebo aquilo que me cansa na esmagadora maioria da opinião publicada, na net ou nos jornais: uma certeza sem falhas, a posse absoluta da razão, a ironia que esconde a fraqueza dos raciocínios (muitas vezes recorrendo ao insulto desnecessário e injustificado), a incapacidade de escrever pensando (não de ter ideias, aí, desde o governo até ao mais humilde adepto de futebol, todos estão cheios de ideias).
Em suma, sinto muita falta de uma discussão que se torne encontro e procura de um pensamento e de uma construção, ambos melhores do que aquilo que cada um trouxe para ela.

terça-feira, agosto 19, 2008

Obedience To Authority (5)

"Muitas das pessoas estudadas na experiência estavam em certo sentido contra o que faziam ao aprendiz, e muitas protestaram mesmo enquanto obedeciam. Mas entre pensamentos, palavras, e o passo crítico de desobedecer a uma autoridade malévola, reside um outro ingrediente, a capacidade de transformar crenças e valores em acção. Alguns sujeitos estavam totalmente convencidos do mal que estavam a fazer mas não conseguiram arranjar coragem para provocarem uma ruptura com a autoridade. Alguns tiraram satisfação dos pensamentos que tiveram, e sentiram que - no seu interior, pelo menos - assim ficavam do lado dos anjos. O que eles fracassaram em se aperceber é que os sentimentos subjectivos são largamente irrelevantes para o problema moral ali em jogo enquanto não forem transformados em acção. (...) As tiranias são perpetuadas por homens tímidos, inseguros, hesitantes, que não possuem a coragem necessária para actuarem de acordo com as suas crenças."

Milgram, S. Obedience To Authority. London: Pinter & Martin Ltd, 2005. (pp 11-12)

segunda-feira, agosto 18, 2008

Obedience To Authority (4)

"Pelo menos um aspecto fulcral da situação na Alemanha não foi estudado aqui - nomeadamente, a intensa desvalorização da vítima antes de actuar contra ela. (...)

De considerável interesse, porém, é o facto de muitos sujeitos desvalorizarem asperamente a vítima como uma consequência de actuarem contra ela. Comentários como, 'Ele era tão estúpido e teimoso que merecia receber os choques', foram comuns. Uma vez tendo actuado contra a vítima, estes sujeitos acharam necessário vê-la como uma pessoa desprezível, (...)"

Milgram, S. Obedience To Authority. London: Pinter & Martin Ltd, 2005. (p. 11)


Nota: Professores, perceberam a técnica que este Governo usou convosco? E perceberam as reacções das pessoas em relação a vocês, que se estendem ainda até aos dias de hoje?

domingo, agosto 17, 2008

Obedience To Authority (3)

(2) aqui.

"(...) Depois de testemunhar a submissão à autoridade, nas nossas próprias experiências, de centenas de pessoas vulgares , tenho de concluir que a concepção de Arendt da «banalidade do mal» aproxima-se mais da verdade do que qualquer um se atreveria a imaginar. A pessoa comum que deu choques eléctricos à vítima fê-lo por um sentido de obrigação - uma concepção dos seus deveres como sujeito - e não por causa de quaisquer tendências agressivas.

Esta é, talvez, a lição mais fundamental do nosso estudo: pessoas comuns, a fazerem simplesmente o seu trabalho, e sem qualquer hostilidade particular da sua parte, podem tornar-se agentes de um terrível processo de destruição. Além disso, mesmo quando os efeitos destrutivos do seu trabalho se tornam patentemente claros, e é-lhes pedido que desempenhem acções incompatíveis com normas fundamentais de moralidade, relativamente poucas pessoas têm os recursos necessários para resistir à autoridade(*). Uma gama variada de inibições para desobedecer à autoridade começa a actuar e consegue manter a pessoa no seu lugar."

Milgram, S. Obedience To Authority. London: Pinter & Martin Ltd, 2005. (pp 7 - 8)


(*) Mais: nunca nenhuma das pessoas estudadas mostrou vontade de pôr fim à realização da experiência, por exemplo, revelando a intenção de se queixar às autoridades competentes.

sexta-feira, agosto 15, 2008

Este aqui sou eu, hoje, a divertir-me no mar...



(foto tirada da daqui, da National Geographic)

Mulheres vítimas de violência

7 terrible abuses suffered by women around the world

(via 5dias.net)

Para começar a parar com isto: não ensinar as crianças a resolverem problemas recorrendo à violência.
Como? Não usando de violência com elas. Não usando de violência com quer que seja, na casa ou na rua.
Parece claro.

Mas, se depois, quando vão para a escola elas começam a ser vítimas da violência dos outros e não lhe sabem responder (como aconteceu com o meu filho)?

Não me venham com a treta de apelar para a escola, porque a escola hoje em dia
NÃO TEM MEIOS ABSOLUTAMENTE NENHUNS DE GARANTIR A INTEGRIDADE FÍSICA E PSICOLÓGICA DOS SEUS ALUNOS CUMPRIDORES E BEM COMPORTADOS! (eu sei do que estou aqui a falar, sou professor e pai)

E já não sei responder.

Mas sei que a responsabilidade dos homens (ajudados, admitamo-lo, por algumas mulheres que ajudam a perpetuar esta cultura e tradição - atente-se nas fotos do link acima) no sofrimento das mulheres é gigantesca e infinita. E isso causa-me uma infindável vergonha.


Adenda: repare-se que, em 3 das fotos, mulheres participam activamente nos abusos. Sim, todos sabemos que as mulheres têm sido responsáveis pela aplicação e manutenção de práticas abusivas e cruéis sobre elas próprias. É triste.
Terá isto alguma coisa a ver com o que as minhas colegas nunca se cansam de referir, que não há pior inimigo da mulher do que a própria mulher?

quinta-feira, agosto 14, 2008

Do Amor: algumas anotações

A maior diferença que encontro entre a pessoa em que me tornei hoje e o adolescente que fui é que, então, eu sonhava com o Amor, e agora não consigo deixar de sonhar com ele (pode-se aprender a não ser amado?).

Sempre tive a maior curiosidade em me informar sobre o Amor. Não percebi que, ao contrário, devia ter-me antes educado.

Apesar de reconhecer que o tratamento por "tu" é mais sensual e excitante, aprecio um tratamento por "você" que mantenha o mais tempo possível o mistério que somos um para o outro.

Acho a boa educação e a suavidade de maneiras altamente desejável quando me relaciono com uma mulher. No jogo de aproximações entre um homem e uma mulher, uma palavra grosseira, uma piada pesada, um beijo invasivo, etc, são como pedradas num charco: de certa maneira sentimo-nos salpicados de lama... mesmo quando conseguimos por fora um (sor)riso tolerante.

É aos cinquenta anos que eu fico a saber que falhei a minha vida. Para me salvar procuro reconhecer os meus limites: muitos deles têm a realidade apenas da imaginação. Vou-me descobrindo no alto-mar sem terra à vista. Mas é um começo. Um dia, talvez um dia, a encontre.

O primeiro inimigo do(a) tímido(a) no Jogo do Amor é o orgulho, a inaptidão para o ridículo. O segundo é a solidão, o aquário em que se meteu para fugir à dor inesperada: é que não é fácil sair dele (onde aliás já ninguém consegue verdadeiramente tocar-lhe).

Sonho amar uma mulher bonita. Mas só encontro raparigas velhas (dos 13, 14 anos aos 60, 65).

quarta-feira, agosto 13, 2008

Randy Pausch, Professor

Esta é a sua famosa última aula dada em 18 de Setembro de 2007, na Universidade de Carnegie Mellon, antes de morrer.
Vale cada minuto que utilizemos da nossa vida a ouvi-la.



Aqui a indicação do livro a que deu origem.

Aqui a notícia do Público, com um curtíssimo excerto legendado do vídeo (tirado do início e do fim da aula)

I think the only advice I can give you on how to live life well is ... - um curto vídeo do seu discurso na cerimónia de formatura na sua Universidade em 18 de Maio de 2008.

Faleceu a 25 de Julho de 2008.

terça-feira, agosto 12, 2008

Mark Twain


It is by the goodness of God that in our country we have those three unspeakably precious things: freedom of speech, freedom of conscience, and the prudence never to practice either.




(via Success Soul)

segunda-feira, agosto 11, 2008

Obedience To Authority (2)

(1) aqui.

"(...) O objectivo da experiência é determinar até onde vai uma pessoa, numa situação concreta e mensurável, em que lhe é ordenado que inflija sofrimento e dor crescentes [através de electrochoques] numa vítima que protesta e se queixa. Em que ponto é que o sujeito se recusa a obedecer ao experimentador?
(...)
A reacção inicial do leitor à experiência poderá ser perguntar-se porque é que alguém no seu juízo perfeito haveria de administrar até mesmo os primeiros choques. Não seria de recusar simplesmente e sair do laboratório? Mas o facto é que ninguém jamais o faz. Desde o momento em que entra no laboratório para ajudar o experimentador, o sujeito está mais do que disposto a iniciar os procedimentos. (...)
(...)
Muitos sujeitos obedecerão ao experimentador independentemente do quão fortes ou veementes sejam os pedidos da pessoa a sofrer os choques eléctricos, independentemente de quão dolorosos os choques pareçam ser, e independentemente de quanto a vítima suplica para a deixarem sair. Isto foi visto vezes sem conta nos nossos estudos e foi observado em várias universidades onde a experiência foi repetida [nos Estados Unidos, Alemanha, Itália, África do Sul e Austrália (p. 171)(*)]. É a extrema boa vontade e disponibilidade de adultos para irem a quase qualquer extremo sob as ordens de uma autoridade que constitui a principal descoberta do estudo e o facto a exigir mais urgentemente uma explicação.
(...)"

Milgram, S. Obedience To Authority. London: Pinter & Martin Ltd, 2005. (pp 5 - 7)

(*) Aqui referem-se também os seguintes países: Reino Unido, Jordânia, Espanha, Áustria e Holanda.

domingo, agosto 10, 2008

Museu Nacional de Etnologia


Excelente museu!
Modesto, mas muito bonito e com funcionários muito simpáticos.

Obrigatório ver a exposição "Pinturas cantadas: arte e performance das mulheres de Naya" e o respectivo documentário: das doces, corajosas e sorridentes mulheres de Naya, acrescento eu.

Também comovente a exposição "Drôty.sk: a arte do arame": da Eslováquia, um país que conquistou a minha simpatia quando lá estive, o trabalho delicado, inventivo, muitas vezes útil e sempre belo de se ver dos artesãos de antigamente e dos artistas de hoje.

Depois as visitas amigavelmente guiadas ao "Mundo rural português" e aos "Índios Wauja da Amazónia".

Comprados os catálogos das exposições, beber uma bebida fresca na esplanada e ou comer qualquer coisa, conversar simpaticamente com outros visitantes do museu sobre o que se viu e ouviu, ou ler um pouco, e assim se completa um domingo bem passado.

Pena de morte?

Há uns dias escrevi isto a propósito do pai que abandonou os filhos na estrada:

"Gostaria de poder dizer que a culpa é de Sócrates que instituiu um clima de falsidade, de crueldade e de inveja, e erigiu tudo isto a valores do regime.
Gostaria de poder dizer que a culpa é das pessoas que acham que ser-se bom não dá "pica".
Gostaria de poder dizer que a culpa é do dito pai. Mas sobre isto nada sei dizer, porque tudo o que se diga é dizer pouco.
Posso dizer que a culpa é minha por todas as vezes em que fui cruel, ou em que deixei passar em silêncio a crueldade dos outros. Isto, eu sei."

Assisti por vídeo à execução de um criminoso. A razão apresentada para tal acto foi ele estar a ameaçar de morte uma vítima inocente.
Toda a gente mostrou uma desmesurada alegria pelo acto.
Mas eu questiono-me.
A pena de morte foi legalizada em Portugal? Ou já se pode matar para prevenir crimes de morte? Ou seja, sempre que alguém apontar uma arma à cabeça de outra, o assassínio fica automaticamente justificado? Isto sempre sem passar pelos tribunais, claro.
Se eu fosse um dos reféns como estaria a sentir-me agora? Aliviado, sim, sem dúvida. Mas o facto de toda a gente dizer, sem o dizerem explicitamente, que eu fui a causa da morte de um ser humano, isso deixar-me-ia indiferente? Ou agoniado?
E, finalmente, se o executado fosse português, sem cadastro tal como eles, e a execução fosse no Brasil, por um sniper brasileiro, o gáudio geral seria o mesmo (como João Marcelino e Ferreira Fernandes)?
Sinto-me inquieto. Não sei se este é o país com que me identifico. Além disso, estarei alguma vez a salvo no meio deste ódio todo, no meio desta miserável alegria?

Nota: JoãoMarcelino no DN: "(...)
Solidarizo-me com a dor deles. (...)" Com a das vítimas? Com a da família das vítimas? Com a da comunidade brasileira em Portugal? Com a dos reféns, por se poderem sentir a causa da execução? Não, não, não e não. A solidariedade (a identificação?) é com os carrascos... A Loucura da Normalidade (Arno Gruen)

sexta-feira, agosto 08, 2008

Quadrilha de malfeitores

A minha amiga, paraplégica, filha única, pai falecido, mãe com Alzheimer (num lar privado, que os da Segurança Social não têm lugar), recebia do IRS cerca de 600€.
Este ano teve de pagar 500€.
O roubo é de cerca de 1100€.

Ainda não há muito tempo, gente desta seria corrida à chicotada.
Hoje chegam a governantes.
Sinal dos tempos.

quinta-feira, agosto 07, 2008

Simplesmente. Não contra nada nem ninguém. Apenas aceitar. Sem resignação.

O que se ganha: uma vida muito, muito intensa, para o bem e para o mal. Sem distracções.
Por exemplo, um banho no mar - e é a felicidade absoluta, total.

O que se exige para o conseguir: uma disciplina mental e física, não direi férrea, mas espartana, sem dúvida.

A saber, sem preocupação de ordem:

- Não olhar para o passado, seja com nostalgia, com piedade, ou com revolta... E nunca perder tempo a imaginar que teria sido melhor "Se eu tivesse feito de maneira diferente..."

- Nunca recriminar nada nem ninguém pelo que se viveu de menos bom.

- Manter uma actividade mental exigente, para não ficar estúpido: por exemplo, preferir a leitura de ensaios à de ficção; e, dentro desta, optar pelas biografias não autorizadas (autobiografias é que nunca, pois são demasiado falsas e complacentes).

- Não ter dependências: de pessoas, cigarros, álcool ou drogas (nem das legais nem das outras).

- Evitar devaneios com o lado amoroso, bom e doce das mulheres, dado que é apenas um lado entre muitos e, hoje em dia, de acordo com a moda (elas pensam que assim não dão "pica"), um dos mais efémeros e menos valorizados.

(Aliás, quando alguém se refere a uma pessoa do outro sexo, as palavras ditas vêm de um fundo que se estende desde a amargura até à ironia, sem passar pela doçura. Tempos ásperos, estes. E as pessoas vivem resignadas a esta indigênia emocional.)

- Não ver TV e fechar-se a qualquer tipo de publicidade, pois ambas instilam desejos e expectativas ilusórias e, muitas vezes, antagónicas com a realidade.

- Manter uma actividade física exigente, senão fica-se mole.

- Para evitar o entorpecimento intelectual e dos sentidos, levar uma vida frugal, comer pouco mas variado (doces estão totalmente fora de questão).

- Ter um objectivo, pelo menos, em mente que possa ser alcançado na actualidade; não adiar para um futuro vago a luta por o conseguir.

- Manter uma higiene pessoal rigorosa e intransigente, o sentido da dignidade começa aqui.

- Nunca gastar forças a ruminar no que falta, mas viver e aproveitar conscientemente o que se tem.

sábado, agosto 02, 2008

Enfim, ...



Dr. David Erneman para Susanne Verin:
- Não, eu não a amo. Mas quero tocá-la, quero que o seu fogo alivie o meu entorpecimento. (...)




(Uma Lição de Amor, Ingmar Bergman, 1954)

sexta-feira, agosto 01, 2008

Princípio

Amar genuinamente as mulheres em geral. Mas não amar verdadeiramente nenhuma mulher real, concreta.

Ser consequente: viver só (sem fazer ninguém infeliz) e sem se queixar. Assim, talvez não se deixe de ser Homem.