quarta-feira, setembro 21, 2011

Rei Édipo, Sófocles

(com introdução, tradução do grego e notas de Maria do Céu Zambujo Fialho)

A história é por demais conhecida, por isso aqui deixarei apenas algumas questões que nasceram de uma leitura apaixonada.

Édipo é sempre auto-determinado. Ele decide sempre por si próprio, não se deixa levar pelo que os outros dizem. O problema é que ele assim afunda-se na tragédia. Será que Sófocles faz aqui uma apologia da submissão e da passividade? Pelo menos à vontade dos deuses?
No entanto, Édipo responsabiliza-se sempre a si próprio pelo que faz e nunca deita as culpas para cima dos outros ou dos deuses. E Sófocles oferece-nos aqui um retrato grandioso desta personagem, com a qual não podemos nunca deixar de simpatizar e de admirar. Portanto, não parece que defenda a submissão. Ao contrário de Laio e de Jocasta, que procuram enganar os deuses com estratagemas, Sófocles constrói um Édipo corajoso e sempre pronto, por mais terrível que isso lhe pareça, a enfrentar as coisas como elas são.
Quando a boa fortuna de um poderoso começa a cair, aí surge a paranóia de que o andam a trair. Mais uma vez, repare-se que a grandeza de Édipo volta aqui a revelar-se, pois nem essa humana paranóia o faz desviar da busca implacável da verdade, não se perdendo em perseguições e castigos inúteis.
Infelizmente, é essa coragem e inteireza que vai provocar e revelar a sua desgraça. Por isso, interrogo-me sobre qual seria a posição de Sófocles sobre esta sua personagem, o que pensaria ele realmente de Édipo e do seu confronto com os deuses, ...

Uma reflexão adicional sobre Creonte. Nesta peça, Creonte mostra aqui grande sensatez, raciocínio lúcido e um saber bem como lidar com os outros. É um Creonte completamente distinto do de Antígona. Sófocles evidencia aqui algo que começamos a reconhecer hoje em dia: nós somos o que somos é certo que por factores disposicionais, mas também, e muito, devido a factores situacionais. É assim que Creonte próximo do rei é uma coisa, sendo rei é outra muito diferente.

segunda-feira, setembro 19, 2011

Confiar: um valor em défice

José Gil, no Jornal de Letras de 24 de Agosto de 2011:

O que eu lamento é a ausência de uma onda que possa captar essas energias, que por isso são desperdiçadas.
Nós somos bons em muitas áreas, mas actuamos como bolsas isoladas.
E isso não faz onda.
Não há comunidades.
É preciso que os muitos nichos em que somos bons, como na artes plásticas, música, dança, teatro, literatura, se cruzem e criem uma massa crítica que se mova por si própria.


Uma razão por que não há esse cruzamento (e muito menos um encontro, acrescento eu) não poderá residir no facto de ninguém confiar em ninguém? De todos sabermos que, por mais mérito que possamos ter, não haverá qualquer reconhecimento? A menos, claro, que pertençamos a um qualquer grupo que esteja próximo do poder?

Não será esta falta de confiança mútua que faz com que os realmente bons prefiram iniciativas solitárias, de modo a poderem concentrar-se no seu trabalho e a não terem que se dispersar por preocupações com políticas e intrigas?

domingo, setembro 18, 2011

Gandhi, sempre no coração

Satish Kumar, em entrevista ao i:

Muitos dizem que os seus ideais são utópicos. O que responde a isso?

Muita gente diz-me que eu sou idealista e que tenho de ser realista.

A minha resposta é: o que é que os realistas fizeram pelo mundo? O que é que alcançaram?
Por estarmos a ser governados por realistas temos uma crise económica, temos aquecimento global, temos guerra no Afeganistão, Líbia e em outros tantos países.
Os realistas criaram esta confusão toda. 
É altura de os realistas saírem e de os idealistas entrarem.
Isto não é mero idealismo, é um idealismo realista.
Vamos dizer: adeus realismo, bem-vindo idealismo!

Satish Kumar também refere que Gandhi disse:

There is enough in the world for everybody's need, but not enough for anybody´s greed.
(Há no mundo o suficiente para as necessidades de todos, mas não para alimentar a ganância de todos).