terça-feira, agosto 25, 2015

Estado de Sítio, Albert Camus - III

(...)
O homem [a Peste]: Perdoai-me que vos interrompa [ao governador]. Mas gostaria imenso de vos ouvir declarar com precisão, diante deste povo, que consentis de espontânea vontade nestas úteis disposições e que se trata de um acordo formado com plena liberdade.

O governador olha para o lado do homem e da sua secretária. Esta leva o lápis à boca [que usa para riscar nomes do seu caderno, matando quem é riscado].

O governador: Com certeza, é em plena liberdade que concluo este acordo.

Balbucia, recua e foge. O êxodo começa.

O homem, ao primeiro alcaide: Faz favor, não vá com tanta pressa! Tenho necessidade de um homem que conte com a confiança do povo e por intermédio do qual eu dê a conhecer as minhas vontades. (O primeiro alcaide hesita.) Aceita, é claro... (À secretária:) Cara amiga...
O primeiro alcaide: Mas com certeza, é uma grande honra.
O homem: Perfeitamente. Nestas condições, cara amiga, comunicará ao alcaide quais os decretos que é preciso dar a conhecer a essa boa gente, a fim de que possam começar a viver dentro dos nossos regulamentos.
A secretária: Decreto concebido e publicado pelo primeiro alcaide e seus conselheiros...
O primeiro alcaide: Mas eu ainda não concebi nada...
A secretária: É um trabalho que lhe poupamos. E parece-me que se deve sentir lisonjeado por os nossos serviços tomarem a seu cargo a redação do que vai ter a honra de assinar.

Camus, A. (1948). Estado de Sítio. Lisboa: Livros do Brasil (p.68-70)

L'homme: Pardonnez-moi de vous interrompre. Mais je serais heureux de vous voir préciser publiquement que vous consentez de plein gré à ces utiles dispositions et qu'il s'agit naturellement d'un accord libre.

Le gouverneur regarde de leur côté. La secrétaire porte le crayon à sa bouche.

Le gouverneur: Bien entendu, c'est dans la liberté que je conclus ce nouvel accord.

Il balbutie, recule et s'enfuit. L'exode commence.

L'homme, au premier alcade: S'il vous plaît, ne partez pas si vite ! J'ai besoin d'un homme qui ait la confiance du peuple et par l'intermédiaire duquel je puisse faire connaître mes volontés. (Le premier alcade hésite.) Vous acceptez naturellement... (À la secrétaire.) Chère amie...
Le premier alcade: Mais, naturellement, c'est un grand honneur.
L'homme: Parfait. Dans ces conditions, chère amie, vous allez communiquer à l'alcade ceux de nos arrêtés qu'il faut faire connaître à ces bonnes gens afin qu'ils commencent de vivre dans la réglementation.
La secrétaire: Ordonnance conçue et publiée par le premier alcade et ses conseillers ...
Le premier alcade: Mais je n'ai rien conçu encore ...
La secrétaire: C'est une peine qu'on vous épargne. Et il me semble que vous devriez être flatté que nos services se donnent la peine de rédiger ce que vous allez ainsi avoir l'honneur de signer.

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