O camuflado, ou qualquer outra farda militar, encerra uma carga simbólica poderosíssima de respeito pelas regras, de lealdade inquebrantável perante o inimigo (valor muito importante num país que esteve em guerra até ainda não há muito tempo), de verticalidade e de incorruptibilidade face à sociedade civil. Claro que tudo isto é uma fantasia, como sabemos pelos casos na instituição militar, sejam de corrupção, sejam de desrespeito pela vida, que têm vindo a lume na imprensa.
No entanto, isso não impede que, no mundo ocidental, muita gente anseie por um regime militar; ou, pelo menos, que deseje ser governada por militares. Aliás, nos mais variados países desenvolvidos, os jovens que consideram essencial viver numa democracia estão a reduzir-se a uma significativa minoria. Veja-se um retrato absolutamente assustador das atitudes da população face à ideia de democracia em:
Foa, R. S., & Mounk, Y. (2017). The Signs of Deconsolidation. Journal of Democracy, (1), 5-16.
Vemos bem a que é que esse desejo por militares no governo nos leva no presente (Brasil e Birmânia são dois exemplos devastadores) e no passado, tanto no recente (Chile e Grécia), como no mais longínquo. Mas a evidência não interessa às pessoas. O mito e o símbolo são mais fortes.
O que é aberrante é ver políticos e democratas de esquerda a alimentarem, de forma suicida, este mito perigosíssimo para a democracia… democracia, aliás, que é o que os sustenta a eles próprios.
Quando os políticos passam a mensagem de que fracassaram miseravelmente, e de que têm de ir buscar alguém fora dos quadros profissionais competentes do atual regime (a uma instituição que, pela natureza muito especial das funções a que é habitualmente chamada a exercer, não é intrinsecamente democrática) para resolver um problema, aí não auguro nada de bom para esta democracia.
Por muito excelente pessoa, político e profissional que seja o sr. vice-almirante Gouveia e Melo.
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