Simplesmente. Não contra nada nem ninguém. Apenas aceitar. Sem resignação.
O que se ganha: uma vida muito, muito intensa, para o bem e para o mal. Sem distracções.
Por exemplo, um banho no mar - e é a felicidade absoluta, total.
O que se exige para o conseguir: uma disciplina mental e física, não direi férrea, mas espartana, sem dúvida.
A saber, sem preocupação de ordem:
- Não olhar para o passado, seja com nostalgia, com piedade, ou com revolta... E nunca perder tempo a imaginar que teria sido melhor "Se eu tivesse feito de maneira diferente..."
- Nunca recriminar nada nem ninguém pelo que se viveu de menos bom.
- Manter uma actividade mental exigente, para não ficar estúpido: por exemplo, preferir a leitura de ensaios à de ficção; e, dentro desta, optar pelas biografias não autorizadas (autobiografias é que nunca, pois são demasiado falsas e complacentes).
- Não ter dependências: de pessoas, cigarros, álcool ou drogas (nem das legais nem das outras).
- Evitar devaneios com o lado amoroso, bom e doce das mulheres, dado que é apenas um lado entre muitos e, hoje em dia, de acordo com a moda (elas pensam que assim não dão "pica"), um dos mais efémeros e menos valorizados.
(Aliás, quando alguém se refere a uma pessoa do outro sexo, as palavras ditas vêm de um fundo que se estende desde a amargura até à ironia, sem passar pela doçura. Tempos ásperos, estes. E as pessoas vivem resignadas a esta indigênia emocional.)
- Não ver TV e fechar-se a qualquer tipo de publicidade, pois ambas instilam desejos e expectativas ilusórias e, muitas vezes, antagónicas com a realidade.
- Manter uma actividade física exigente, senão fica-se mole.
- Para evitar o entorpecimento intelectual e dos sentidos, levar uma vida frugal, comer pouco mas variado (doces estão totalmente fora de questão).
- Ter um objectivo, pelo menos, em mente que possa ser alcançado na actualidade; não adiar para um futuro vago a luta por o conseguir.
- Manter uma higiene pessoal rigorosa e intransigente, o sentido da dignidade começa aqui.
- Nunca gastar forças a ruminar no que falta, mas viver e aproveitar conscientemente o que se tem.
4 comentários:
É assim que pensa? Ou foi um momento menos bom que levou a este post?
Um pouco assustador...
Olá, Adriana. Não é nada assustador. Pode crer que vivo mais feliz assim (embora os momentos maus sejam mesmo maus, claro; mas são raros e são-no cada vez mais).
Isto foi escrito após ter superado um acontecimento mau; e foi desta maneira que o superei por cima. A verdade é que mantenho tudo o que aqui escrevi e que continuo a praticar: por exemplo, já vou nos 3 meses sem abrir a tv excepto para ver os dvd's do Bergman.
Este post fez-me recordar o post "a balança" do blog "não compreendo as mulheres": por mim, estou definitivamente no prato "estou muito bem assim".
Bjs
(Atenção: este comentário é um abuso desta sua caixa de correio. Sinta-se à vontade para o apagar!)
Sou fã do Bagaço Amarelo! É um dos melhores blogues que por aí andam (não desfazendo). Ainda hoje reli esse post que refere a uma amiga recentemente divorciada.
Eu ainda não me decidi qual o prato da balança. Procuro que os momentos bons sejam mais que os maus, mas não à custa de sofrimento.
Os 3 meses sem abrir a tv não me surpreende. Eu ligo para ver o CSI. Normalmente oiço rádio (o seu regime autoriza?). Neste momento oiço o Joel Costa no «Questões de Moral».
:)
Se me permite, vou fazer um pequeno exercício. Não me leve a mal, pois o meu objectivo não é nenhum outro a não ser debater ideias. E estas são as minhas.
:)
Peço desculpa por o invadir com tão desmesurado e talvez inoportuno comentário, mas cá vai:
- Acho que se deve olhar para o passado, pois só com ele aprendemos. É importante integrarmos no que hoje somos aquilo que fomos, pois não nascemos do nada e o que somos ao que já vivemos se deve. Sem nostalgia, piedade ou revolta, claro.
- Concordo consigo. Nada de recriminações. Até para ser coerente com o acima indicado.
- Concordo com a actividade mental exigente, mas não renego a ficção. Um bom policial sabe-me sempre tão bem. Gosto do direito à inutilidade (com moderação, claro).
- Algumas dependências são doces. Podem doer, é verdade, mas enquanto duram são boas. Sou um pouco dependente dos amigos, daquele meu núcleo duro que tem estado sempre lá para mim. Quanto às outras coisas, nem penso nelas (não uso nada disso).
- Ahh, os devaneios amorosos! Sou a favor da doçura, claro. Irresistível. E não aprendo nunca, porque, agnóstica, aí sou uma crente. Dói quando corre mal, mas enquanto dura adoça a vida.
- É fácil não ver TV. Não conta. Quanto à publicidade, gosto de ver filmes publicitários quando são arte.
- Faço alguma actividade física: Pratico esgrima, mas não é por medo de ficar mole, pois energia não me falta.
- A parte da vida frugal... invejo-o, sabe? Gosto de um bom doce, desde que não seja enjoativo. Sou gordinha, já se vê.
- Objectivos que vou cumprindo não me faltam. Acho bem.
- A parte da higiene nem penso nela. Nunca me lembraria de enunciar uma regra sobre isso. Faz parte do quotidiano.
- Concordo com a última, que ligo à primeira e segunda regra.
Como vê, o que me assusta são as regras que me parecem provocar sofrimento e exigir controlo. Se há muito controlo e isso não é plenamente integrado, um dia rebenta.
Enfim, não sou psicóloga e nada disto lhe deve interessar.
Devia apagar e não mandar, mas apeteceu-me falar disto consigo.
:)
Beijinhos
Então permita-me continuar a conversa com a "defesa" dos meus pontos de vista.
Esclareço que sei que estas regras de vida funcionam um bocado como os medicamentos: aquilo que tem virtudes curativas para uns é inócuo ou mesmo prejudicial para outros. E isto serve já para o 1º ponto:
- Sinto que aprendi o que tinha a aprender quando vivi esse passado; a posteriori, ao olhar para ele, acho que até desaprendo. Comigo, pensar no passado é uma via muito fácil para cair numa espiral de dor inútil; daí a regra.
- Devo dizer que, quanto a leituras, sou um aspirador ou um omnívoro: vai tudo. Fala nos policiais: nestas férias deliciei-me com o Georges Simenon (claro que não tenho dinheiro que chegue para livros, portanto sou utilizador assíduo da biblioteca daqui). Mas reconheço que, para manter o pensamento ágil e não conformista, o ensaio é essencial.
- Confesso que a perda, em mim, toma sempre proporções avassaladoras, não sei porquê. E agora já não consigo viver sem sentir que estou sempre a uma lâmina de perder a(s) pessoa(s). Daí a não dependência.
- Tive dúvidas em escrever a parte da higiene. Não era curto de explicar. Refiro-me a pequenos pormenores de higiene como, por exemplo, não transigir a ficar um dia sem fazer a barba (é fácil, quando se está sozinho, pensar que não vale a pena fazê-la, ninguém vê). Aprendi isso no livro Se Isto É Um Homem, onde Primo Levi conta tê-lo aprendido de um companheiro no campo de concentração de Auschwitz.
O controle é-o da destruição, ou seja, de comportamentos que a experiência me mostrou conduzirem-me para uma vida menos autónoma e menos plena.
Mas, como lhe disse no início, cada pessoa é diferente das outras e, portanto, não podem haver generalizações.
Bjs
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