sábado, junho 10, 2006

Uma pena na tempestade

A este país tenho que agradecer todo o lado escuro da minha experiência.”

(Cruzeiro Seixas, JL, 10-23 de Maio de 2006)


A proposta de Estatuto da Carreira Docente apresentada por este Governo assenta em duas ideias-chave:
1ª, Quanto mais se humilhar e se assustar o professor mais cumpridor ele se torna.
2ª, O que motiva verdadeiramente um professor é a ganância e a sede de poder.

Ambas as ideias me passam ao lado.

A 1ª porque não preciso disto para ser cumpridor. Até tenho sido entusiasta das reformas que o Ministério da Eucação tem entendido aplicar ao ensino: porque sempre estive aberto à novidade e à procura de soluções para os problemas.

Quanto à 2ª, se eu fosse sensível a ela, não estaria a dar aulas; com o curso de engenharia civil (média de 14 no IST), teria hipóteses a esse nível muito mais interessantes. Mas mesmo assim analisemo-la:

- Ganância: Ao longo da vida tenho vindo a descobrir que não só o essencial de uma vida, mas também o simplesmente importante, não passa pelos bens materiais (para além de não os poder levar comigo quando morrer). Por isso, apenas preciso do mínimo necessário a uma vida digna. O meu actual ordenado (correspondente ao 7º escalão) é mais do que suficiente para isso. Não vou lutar por mais.

- Sede de poder: Cargos de chefia só os aceitei quando não havia nenhuma outra alternativa. É que sou avesso ao poder, a todas as formas de poder. Apenas uma vez aceitei chefiar o departamento de Matemática, porque a direcção da escola da altura proporcionava um tal clima de abertura, de liberdade e de respeito que eu me senti entusiasmado para avançar. Além de que o departamento tinha professores muito participativos e interessados. Acabou como acabam sempre estas coisas. Fiquei radicalmente alérgico a qualquer cargo de chefia. Não posso deixar de sentir simpatia pela actual proposta que me faz o favor de eu nunca mais ter de me preocupar com a possibilidade de me atribuirem um desses cargos.


Gostaria que as coisas fossem diferentes? Claro que sim, às vezes ainda chego a sonhar. Mas sei que tal não é possível dado o grau de desenvolvimento cívico da maioria dos portugueses... de quem a ministra, aliás, se tem vindo a revelar uma perfeita representante (daí a imensidão de adesões entusiastas que o seu discurso tem suscitado).

Faço minhas as palavras de Cruzeiro Seixas.

2 comentários:

Anónimo disse...

...e o que é que o teu País te poderá agradecer a ti?...
John Kennedy

Rui Diniz Monteiro disse...

País? Isso é uma coisa suficientemente abstracta para os políticos utilizarem para chegar aos seus fins, não é para mim.
Eu lido, convivo e procuro dar oportunidades é a pessoas concretas.
Portanto, não há como dar a palavra a uma delas. E escolho um que foi em tempos um "terror" na minha escola:
"Bem, aqui está o professor que me ajudou a crescer!!! Ajudou-me a controlar as emoções e fico eternamente grato. Espero aprender muito mais!!!" (De um trabalho para Português)
Esperar agradecimentos do "País"? Desde há 20 anos que bem posso esperar sentado!